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O cais grita de dor

O cais está cheio de gente, todo o cais grita de dor. Estão aqui as mulheres, as mães, as velhas com a garganta sufocada e que perguntam numa ânsia:
   - Oh, Jesus!
   - Talvez não tivesse chegado ainda, talvez esteja já em Leixões.
    E um velho pescador explica: 
   - Está aí a companha do Jacinto. Vem lá ao fundo outra com a vela rasgada. Esperem…esperem. 
   - E os da Ti Ana?
   - Por ora não se sabe deles.
   - O meu rico home! O meu rico home!
   Reparo num grupo petrificado. Fixo uma mulher alta, ossuda, com cara de cavalo, toda vestida de escuro, que geme baixinho a meu lado. A roupa encharcada pega-se-lhe ao corpo, as mãos magras e tisnadas, de unhas roídas pelo trabalho, fincam-se-lhe no peito para conter os soluços que lho estalam. Geme sempre, e os olhos tem-nos presos ao longe, no negro torvelinho de mar e céu que se confundem. É das poucas que não gritam, é das poucas, talvez, que compreendem…


Raul Brandão in Os Pescadores

                         
                   Augusto Gomes, Tragédia do Mar                                              José João Brito, “Tragédia do Mar” 
                                           Pintura                                                                                          Escultura

O Doido e a Morte (Excerto)



(…)
E vinham na asa múrmura da aragem
Bater de palmas, risos de cristal,
Rasgando agudas fendas no Silêncio.
Eram Bruxas malditas, pobres Ninfas,
Amantes do Demónio em vez de Pan;
Amam a noite triste e os ermos sítios…
Trocaram seu antigo amor divino
Pela ironia escura e demoníaca;
E as florestas sagradas e o sol claro
Pelos bócos profundos, pela noite,
Pelos silvais espessos e águas ermas
Que a sombra torna lívidas e mortas,
E onde as cousas noturnas se refletem
Desmaterializadas, reduzidas
Ao seu simples e anímico esqueleto…

E outras Bruxas, em bandos luarentos,
Passavam, no ar, dançando em turbilhão
Com alados Demónios coruscantes…

E o Medo, avô remoto de Phantasmas,
Sombra ancestral de Deus e da Piedade,
Condensava o luar em frias lágrimas,
Marmorizava os fluídos Longes vagos…

As Figuras da Noite, as Creaturas
Do nosso Pensamento, despertavam
Mal ouviam trotar a Morte… E a lâmina
Da sua Fouce ia, em curva, pelo céu
De horizonte a horizonte; e a sua túnica
Parecia manchar toda a Paisagem…

(…)
Teixeira de Pascoais

SALGADO, Vasco - “The Project Gutenberg EBook of O Doido e a Morte, by Teixeira de Pascoais”. Janeiro, 2008 In Teixeira de Pascoaes. Porto: Renascença Portuguesa. 1913 [consult. em: 17/01/17] (Disponível em: 
This eBook is for the use of anyone anywhere at no cost and with almost no restrictions whatsoever. You may copy it, give it away or re-use it under the terms of the Project Gutenberg License included with this eBook or online at www.gutenberg.org

THE OLD MAN AND THE SEA

              Amazing animated film                Ver no Youtube

 Na sequência do PAC, o domínio intercultural abordado na língua estrangeira tem vindo a focar autores de renome da literatura norte-americana, entre eles o Prémio Nobel Ernest Hemingway com a sua obra The old Man and the Sea, cujo filme animado se aconselha a ver, claro seguido ou antecedido da obra que lhe deu origem.


O Piloto-Mor

O sr. piloto-mor só abre a boca para ralhar. De quando em quando aquele vozeirão tremendo ecoa na Cantareira e cala-se tudo. Toda a gente tem medo desse homem seco e tisnado, autoritário e duro, de grandes barbas brancas revoltas. Ninguém se atreve a dirigir-lhe a palavra e todos os pescadores, quando ele passa como uma rajada, tiram os barretes da cabeça.
  Noutro dia estiveram alguns barcos em perigo.
  - O salva-vidas!...
  E o salva-vidas lá desceu pelo guindaste até ao rio, mas não apareceu ninguém para o tripular.
  - Então ninguém vai?... - perguntou o piloto-mor.
   Mas os homens em grupo, encolhidos, não responderam.

  - Então vocês têm alma para os deixarem morrer ali à nossa vista
  Um mais atrevido disse, por fim:
  - Quem lá for, lá fica. O salva-vidas não se aguenta com este mar.
  E o vozeirão a sair das barbas brancas:
  - Pois então vou eu, com os diabos! Vou eu e fico lá. E vou sozinho se ninguém quiser ir comigo.
  Saltou dentro do barco - e com ele uma dúzia de homens.


Raul Brandão In Os Pescadores


As palavras


Nenhum de nós sabe o que existe e o que não existe. Vivemos de palavras. Vamos até à cova com palavras. Submetem-nos, subjugam-nos. Pesam toneladas, têm a espessura de montanhas. São as palavras que nos contêm, são as palavras que nos conduzem. Mas há momentos em que cada um redobra de proporções, há momentos em que a vida se me afigura iluminada por outra claridade. Há momentos em que cada um grita: – Eu não vivi! eu não vivi! eu não vivi! – Há momentos em que deparamos com outra figura maior, que nos mete medo. A vida é só isto?


      
Raul Brandão in Húmus (1917)

Foz do Douro

Foz do Douro. Esta velha, crestada pela desgraça e pelo tempo, com sulcos de velhice e de lágrimas na cara é que os impele para o mar. E o mar tem-lhos levado todos. Dobra-se-lhe o corpo exausto, rodilha gasta pela vida. Mas quando o Inverno chega e a fome aperta, é ela que os injuria:
- Má raios partam o mar! Então quereis morrer à fome e os mininos?
Se os batéis estão em perigo, corre a costa, açoitada pelo vento, bebendo as lágrimas e o cuspo do mar, e contendo o coração em farrapos, com as mãos negras apertadas sobre a tábua rasa do peito.
- Quem lhe falta tiazinha?
- O meu filho, o meu neto. Já o maldito me levou o pai, leva-me agora os filhos!
Andou toda a vida de luto. Viu-os despedaçados nas pedras, e deitou toda a ternura que tinha para deitar. Mas incita-os, pragueja, empurra-os para que não haja fome em casa. Só o mar dá o sustento e a morte. Há mais de um mês que dura o Inverno.
- Má raios partam o mar!
E corre com as redes à cabeça, a cesta no braço, e os soluços represados na garganta, levando o neto atrás de si a rastos para o barco.

- Tenho chorado tantas lágrimas como aquele mar salgado! ...


PROJETO DE ANIMAÇÃO COMUM 2016-2017

A PINTURA E A LITERATURA

Retrato de Raul Brandão e de sua esposa D. Angelina Brandão, 1928
COLUMBANO BORDALO PINHEIRO

Óleo sobre madeira
22 × 27 cm
assinado e datado
Inv. 651
Historial
Doação dos retratados, em 1930.
Exposições
Barcelona, 1929; Lisboa: mnac, 1957, 87; Lisboa, 1980, 66; Caldas da Rainha: Museu de José Malhoa, 1994, 4, cor.
Bibliografia
MACEDO, 1952, CVX, p.b.; FRANÇA, 1967, vol. II, 265.; FRANÇA, 1981, 75; Caldas da Rainha, 1994, 70, cor.
    SANTOS, Rui Afonso – “Retrato de Raul Brandão e de sua esposa D. Angelina Brandão, 1928
Columbano Bordalo Pinheiro” [Em linha] Disponível em: <http://www.museuartecontemporanea.pt/pt/pecas/ver/382> [Consult. em: 13 de novembro de 2017]

Raul Brandão












Raul Brandão
1867-1930
Escritor, jornalista e militar
                                           



Olhares sobre…


As Ilhas Desconhecidas 

“Um dos mais belos livros de viagem da literatura portuguesa. A mais completa homenagem aos arquipélagos atlânticos.”



O Reino Maravilhoso

"O escritor confessa com frequência saudades de casa, mas também diz que desejava viver uma vida diferente, uma vida nua, como a daqueles açorianos livres e orgulhosos. Quando escreve sobre a Madeira, elogia uma terra fértil, romântica, voluptuosa e feliz, mas também a considera terrivelmente turística, engalanada para inglês ver. Brandão prefere a melancolia aguda dos Açores, uma paisagem visível que traduz uma inquietação interior. 



As Ilhas Desconhecidas é um magnífico livro de viagens, mas é muito mais que isso: faz da geografia das ilhas portuguesas uma geografia metafísica, tremenda e maravilhosa. Um reino deste mundo e de outros mundos."



    Crítica de Pedro Mexia ao livro As Ilhas Desconhecidas, de Raul Brandão, publicada            no Expresso.